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terça-feira, 29 de janeiro de 2013

II ENCONTRO INTERNACIONAL DAS PARTEIRAS

UMA DECISÃO COLETIVA

          

Minuta – II Encontro Internacional de Parteiras Tradicionais no Amapá

“Carta do Amapá”



“(...) com suas rezas, ervas caseiras... E a missão verdadeira de ajudar os seus... São as “mães Luzias” no meio do mundo...”. Joãozinho Gomes e Val Milhomem.


O Estado do Amapá, situado à margem esquerda do rio Amazonas, cortado pela linha do Equador, onde somos privilegiados pelo fenômeno do equinócio. Nossa maior riqueza está no nosso povo, nos homens e mulheres, filhos descendentes de raça guerreira, descendentes de parteiras, caboclos e “sumanos”, negros, índios, ribeirinhos, castanheiros, da pujança de sua juventude, trabalhadores, empresários, de brasileiros e estrangeiros que buscam e fazem deste solo a sua morada e juntos arduamente constroem um estado para se viver melhor.


É neste cenário místico pela exuberância majestosa da riqueza florestal e humana que ocorreu o II Encontro Internacional de Parteiras Tradicionais no Amapá: memória, identidade e inclusão social, no sentido de expressar o reconhecimento do Amapá à sabedoria da experiência do modo de cuidar das parteiras tradicionais.


O principal objetivo foi estabelecer um diálogo entre diferentes saberes, experiências e modos de cuidar, dando voz a essas mulheres e homens, cujo saber legítimo é invisibilizado pela hegemonia do saber técnico, é resgatar o momento importante de valorização das parteiras tradicionais existentes desde os primórdios da humanidade.


Vale o registro e destacar que foi na década de 90 que o poder público brasileiro, especificamente no Amapá, definiu suas políticas públicas e optou em colocar as parteiras como prioridades na definição das políticas. 


Este momento tem como propósito o fomento da discussão referente à memória, identidade e inclusão social. Compreendemos nesse sentido, o encontro promoveu a valorização dos saberes, entrelaçando a vivencia das parteiras reunidas, os relatos de suas histórias de vida, dialogando com a ciência e saberes institucional como questões de ordem.  


Na expressão da memória, identidade e inclusão social, nós parteiras reunidas apresentamos nosso manifesto com as seguintes referencia e proposições:


Memória, Identidade Cultural e Inclusão Social - No propósito da compreensão da importância das parteiras tradicionais, seja indígena, quilombola, ribeirinha, em suas localidades distribuídas em todo o território nacional e internacional, sugerem o seu reconhecimento, garantindo o respeito às suas práticas.


1 - Pela atuação efetiva que exercem ao longo dos anos, a garantia da valorização de suas práticas fortalecendo sua atuação propriamente dita, bem como a implementação de políticas públicas que apóie o trabalho das parteiras tradicionais:


a)   Ter o reconhecimento da importância e do papel das parteiras tradicionais, extrapolando o imaginário popular. Deve-se criar e/ou fazer legislação e normas que expressem o reconhecimento no campo de “bem cultural imaterial”, do ato de partejar, de suas crenças, ritos e o uso das ervas, como também, no direito de exercer sua função com qualidade, competência, sem discriminação, de ser remunerada, com direito a aposentadoria e do exercício pleno da cidadania.


b)  Consolidar a valorização das parteiras tradicionais na questão financeira, com valores justos e permanentes, tão importantes para sua sobrevivência e custeio de suas necessidades essenciais e básicas. Tal remuneração já se aplica (bolsas auxílios, fundos e salários da prestação de serviços temporários, como exemplo os agentes de saúde). Porém, não são consolidadas, sistêmica e permanente, que muitas vezes por sua vulnerabilidade ficam a mercê de vaidades políticas de gestores e penalizam as parteiras tradicionais, que independente desse reconhecimento continua praticando o oficio.
  

2 - Garantia de apoio das três esferas governamentais (Federal, Estadual e Municipal) e da sociedade como um todo, com o intuito de assegurar o exercício e a atuação, oportunizando as condições necessárias, sem discriminação para o exercício de parteira tradicional:


a) - Faz-se necessário dar condições para o deslocamento para que as parteiras tradicionais possam atender as gestantes, levando em consideração e respeitada as especificidades dos locais e dos meios de condução – via fluvial, terrestres e aéreas. Uma das ações mais urgente que pode contribuir para a melhoria do acesso seria da constituição do “passe livre” para as parteiras tradicionais no âmbito municipal e estadual.


b) - A construção reforma ampliação e estruturação da “Casa de Parto” deve ser uma política pública obrigatória e de prioridade para os governos municipal, estadual e Federal. Por ser o ambiente ideal, garantida e respeitada à escolha e condições da gestante, para que se possa universalizar o atendimento em tempo integral, a valorização, o respeito e o direito da cidadã pelo parto natural. Deixando claramente que “Casa de Parto” não é “Posto de Saúde”.


c) - A realidade Amazônica de baixa densidade demográfica e isolamento territorial necessitam que seja feito investimentos em comunicação, seja na implantação de sistema de rádios transmissores nas comunidades tradicionais distantes dos centros, como também, em telefonia e internet. Ferramentas essenciais e necessárias para a comunicação e o diálogo entre as pessoas e povos.


d) - Os municípios devem implementar as políticas do Sistema Único de Saúde – SUS, no que tange a reposição de equipamentos e materiais necessários para o desempenho da função. Necessário dizer da importância do cadastro, da carteira de identificação das parteiras e o processo continuo de notificação dos eventos, dos partos, nascimentos e outros co-relacionados. Vale salientar da importância da integração e interação entre os agentes de saúde – médicos, enfermeiros, auxiliares e as parteiras tradicionais, visando eliminar atos de discriminação e fortalecer o processo de inclusão social e cidadania.


3 – Com o intuito de assegurar o patrimônio imaterial e material, a construção de um centro de referência nas localidades de atuação das parteiras tradicionais, espaços estes que, sobretudo, agregará todo esse material, que constitui a manutenção dessa identidade, a valorização e a memória desse grupo social. Assim:


a - Criação de um espaço de referência para as parteiras nas cidades sedes dos municípios com a finalidade de promover a organização social, formação, congregação de acolhimento e convívio e de promoção e difusão de informações sociais, culturais e políticas das parteiras.


b - Incorporar nas políticas de saúde dos municípios e do estado, um programa de atendimento para as parteiras tradicionais para que possam estar em condições saudáveis para o exercício do ato de partejar, buscando agir de forma preventiva e/ou no monitoramento e controle da saúde, oportunizando serviços médicos, psicológicos e terapêuticos.


4 – Com o propósito de garantir um aprendizado continuo, sugerem a melhoria das capacitações para as parteiras tradicionais, bem como assegurar esses saberes, sugerindo treinamentos sobre as ervas medicinais mais utilizadas pelas parteiras, para que possam se perpetuar para gerações futuras:


a - Promover uma política de formação continuada das parteiras tradicionais, seja nas atualizações sobre novas tecnologias (técnicas, utensílios, e equipamentos) para o ato de partejar, como também, na promoção da formação integral  da cidadã e do cidadão, desde a alfabetização, elevação do nível de escolaridade, assim como, em  organização social e política. Vale salientar que na organização e execução da política de formação continuada, sejam respeitadas as etnias e suas línguas maternas.
 

“Juntas Somos Fortes!” A organização social é o melhor caminho para lutas e conquistas. A constituição de associação, redes, federações, são urgentes e necessárias para que se universalizem as bandeiras de lutas, a coalizão e conquistas – direitos, valorização, respeito e reconhecimento.


Muito tem sido as lutas, e o acumulo de vitórias, derrotas, avanços e estagnação, mais o importante dessa trajetória é a perseverança da vontade de união. Mais uma vez, nossa força e vontade se encontraram, a partir da decisão de nos unirmos, erguemos nossa luta, a luta pela continuidade, pela busca pelo daquilo que nos é de direito, é um caminho sem volta.
 

A sociedade toma conhecimento mais uma vez de nossa coalização e coesão. Sob as bênçãos de todas as “mães luzias”, as parteiras tradicionais aqui presentes fazem ecoar pelo Amapá, pelas as regiões brasileiras, pelos países e o planeta, os anseios e lutas dos participantes forjados no II Encontro Internacional das Parteiras Tradicionais no Amapá – Memória, Identidade e Inclusão Social”.


Macapá – AP, 26 de maio de 2012.




“... É fácil o meu endereço, vai lá quando o sol se pôr,   na esquina do rio mais belo com a linha do equador” Zé Miguel. 
  

ARQUIVO: POSTAGEM/PROFESSOR PESQUISADOR: NONNATO RIBEIRO
MATERIAL: II ENCONTRO INTERNACIONAL DAS PARTEIRAS DA FLORESTA
LOCAL: CETA ECOTEL/MACAPÁ-AMAPÁ
MAIO DE 2012

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